É sempre assim
Praticamente todos os povos e, nós brasileiros, costumamos perdoar quem esteja à beira da morte, ainda mais, os mortos.
O brasileiro Marco Archer foi condenado à morte há quase dez 10 anos, e no elástico tempo que dispôs, não conseguiu evitar que o pior acontecesse, ou seja, reverter sua condenação. Entretanto, no que dependesse do pedido de clemência, não apenas dele próprio, mas de qualquer um de nós, ninguém se negaria a fazê-lo, mesmo considerando-se a gravidade do crime por ele cometido. Nestas horas, sem dúvida, a humanidade fala mais alto.
Ocorre que, como na Indonésia a guerra contra as drogas foi e continua sendo levada às últimas consequências, nem a nossa diplomacia, e em especial, a envolvimento pessoal da presidente Dilma Rousseff, conseguiu salvá-lo. Do presidente da Indonésia, Joko Widodo, nossa presidente ouviu um sonoro: nada mais resta a fazer. Dito e feito.
Em tempo: quando se chega à Indonésia, seja por terra, ar e mar, o visitante é logo cientificado que, em relação ao tráfico de drogas, suas leis são rigorosíssimas e implacáveis. E mais ainda: no que depender da sua justiça, dos seus governantes e da opinião pública daquele país, a prática deste crime, resulta num castigo máximo, ou seja, em pena de morte. Embora sabendo disso, nosso conterrâneo não se intimidou.
Na guerra contra o tráfico de drogas, ainda que todos os governantes mundiais se digam imbuídos do mesmo propósito, independente de suas crenças religiosas e dos seus regimes políticos, infelizmente, os traficantes estão ganhando, e a provar que sim, vide o seu crescente mercado. Neste particular, só há uma explicação: neste tipo de guerra, assim como na guerra contra o terror, em não sendo possível a identificação de todos os inimigos, torna-se cada vez mais difícil combatê-los.
A propósito, dois lamentáveis episódios envolvendo estas duas guerras, a do tráfico de drogas e a do terror, presentemente, ganharam as manchetes da nossa grande imprensa, e da imprensa mundial, no caso do atentado ao jornal Charlie Hebdo, e todas sugerindo que, se mantidas as mesmas lógicas, não há como enfrentá-las com a eficiência e a urgência requeridas.
Falando-se em guerras, sob qualquer ângulo que venha ser avaliada, o atentado ao jornal Clarlie Hedbo minimizou a execução do brasileiro Marco Archer, afinal de contas, entre uma barbárie e outra, mesmo sendo ínfimo o número de terroristas islâmicos, só na Europa, estima-se que existem 5.000 jovens com perfil semelhante ao dos irmãos Said e Chérif Koauchi e, portanto, dispostos a morrerem pela mesma causa, ou mais precisamente, levados pelo fanatismo. De mais a mais, um terço dos milhões de mulçumanos europeus entende que os atentados já havidos, e os que estão por vir, são justificáveis. É neste particular que mora o perigo.
Conclusão: se estamos passando por um choque de civilizações, e nós, ocidentais, neste quesito, nos julgamos bastante superiores, jamais deveríamos provocar aqueles que, em nome da sua fé, por vezes cega, já se revelaram capazes de praticar qualquer barbárie.
Ao invés de continuarmos tratando a liberdade de expressão como valor absoluto, quem sabe, uma razoável dose de responsabilidade e respeito a quem, nós mesmos, consideramos fanáticos, em muito pudesse contribuir para que novos atentados não voltassem a se repetir.